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Contabilidade criativa: afinal, de quem é a culpa?

Até pouco tempo atrás, a culpa pela insegurança nas informações contábeis era atribuída à “inflação”

Até pouco tempo atrás, a culpa pela insegurança nas informações contábeis era atribuída à “inflação”. A inflação distorcia os valores do Ativo, das despesas e receitas, e o Contador, profissional responsável pelo estudo do patrimônio (causas e efeitos), tinha dificuldade para decidir que ações o agente econômico deveria tomar.

 

Hoje, com a convergência das práticas contábeis brasileiras às práticas contábeis internacionais, estamos colocando em risco a utilidade das demonstrações contábeis como instrumento de gestão e de análise externa de resultados econômicos e financeiros.

 

O subjetivismo gerado por conceitos discutíveis, que alterou, sem sustentação técnico-científica, o princípio do “patrimônio monetário” (onde o Ativo deixou de ser entendido como “direito de propriedade” e passou a ser considerado “direito de posse” e onde o custo de aquisição dos ativos e das dívidas foi substituído pelo “valor justo”, “valor presente”, “valor de rentabilidade futura” e etc.) vem dando margem para comentários de que estamos diante de uma “contabilidade criativa” ou “enganosa”.

 

Além da complexidade dos procedimentos adotados para ajustar as contas dos grandes agentes econômicos, as notas explicativas anexas às demonstrações contábeis não explicam com clareza o que efetivamente foi ajustado, como foi ajustado e qual o reflexo destes ajustes no resultado econômico, no Ativo, nas dívidas e no Patrimônio Líquido. O Contador tem dificuldade em saber se nos saldos finais das contas estão contidos os ajustes e como estes ajustes foram gerados. Não sabe, ainda, se o resultado (lucro ou prejuízo) foi constituído através da exploração das atividades operacionais ou através de ajustes efetuados nos ativos e passivos.

 

Isso tudo é muito triste para nós contadores, que dependemos das informações contábeis para orientar os nossos clientes, e a sociedade em geral, sobre a segurança que os agentes econômicos oferecem na geração de emprego, renda e rentabilidade; e para sugerir procedimentos a fim de melhorar a gestão dos negócios.

 

Como o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) defende esta convergência das práticas contábeis brasileiras às práticas internacionais sem avaliar devidamente as causas e implicações desta convergência, os contadores brasileiros esperam agora que a entidade também defenda, junto ao Comitê de Normas Internacionais, que as empresas que adotem estas normas sejam obrigadas a divulgar, através de demonstrativo próprio, o resultado da exploração das atividades operacionais, excluindo do resultado contábil todos os ajustes efetuados que modificaram o “preço de aquisição”. Assim, haverá mais transparência e segurança nos resultados apurados e as informações contábeis servirão realmente de ferramenta de análise para o Contador na tomada de decisões de gestão.

 

Com a divulgação deste demonstrativo, os investidores nacionais e estrangeiros e a sociedade conhecerão o resultado real (lucro ou prejuízo) dos agentes econômicos e sociais, deixando de questionar a “criatividade” da contabilidade.

 

 

Salézio Dagostim é contador; pesquisador contábil; professor da Escola Brasileira de Contabilidade (EBRACON) e da FACENSA (Rede CNEC); autor de livros de contabilidade; fundador e ex-presidente do Sindicato dos Contadores do Estado do Rio Grande do Sul;sócio do escritório contábil estabelecido em Porto Alegre (RS), Dagostim Contadores Associados, à rua Dr. Barros Cassal, 33, 11º andar -  salezio@dagostim.com.br