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A responsabilidade dos contadores e as indenizações pela aplicação das IFRS
Os comentários aqui desenvolvidos não se aplicam às sociedades limitadas consideradas como de grande porte, pois estas devem seguir as normas da Lei 6.404/76.
As sociedades do tipo limitadas, exceto as consideradas de grande porte, estão obrigadas à elaboração das demonstrações contábeis cuja aprovação deve se dar no exercício seguinte, até 31 de março, nos termos Código Civil de 2002. Estas demonstrações contábeis são conhecidas como Trípode Contábil.
Em ato contínuo à convocação para está aprovação, nos termos do § 1° do art. 1.078 do CC/2002, a norma impõe que devem ser postas à disposição dos sócios não administradores as peças contábeis, tomando o gestor a devida precaução de fazê-lo através de protocolo, que é o documento probante do respectivo recebimento. Este prazo é de 30 dias antes da aprovação, por determinação do § 1°, art. 1.078 da Lei 10.406/02, portanto, prazo que finda em 31 de março do ano seguinte, para se dar publicidade. O prazo final para a aprovação é 30 de abril.
E com este referente, tratamos dos cuidados que o contador deve ter em relação à elaboração destas demonstrações contábeis, em especial o seu conteúdo de avaliação e composição patrimonial. Diante de duas possibilidades, a Resolução CFC 1.159/09 e o Código Civil, o que seguir? Eis a causa de um possível envolvimento em responsabilidade.
Neste caso, o Código Civil e os seus princípios devem sobrepor-se à legislação infralegal, Resolução CFC 1.159/09, para se evitar um dano maior à estabilidade jurídica, de todo o sistema legal de prestações de contas dos administradores de pessoas jurídicas, constituídas no gênero de sociedade empresarial e dos tipos societários que não estão enquadrados como sociedades anônimas e nem como sendo de grande porte. O inverso cria uma insegurança jurídica muito grande às prestações de contas e aos critérios de avaliações de contas, em especial as de ativos, passivos e resultados, além de responsabilidades por danos. Portanto, a legislação infralegal deve ser afastada para que sejam aplicados os princípios maiores do ponto de vista da hierarquia das leis, devendo o Código Civil se sobrepor à Resolução CFC 1.159/09.
A responsabilidade por danos, e no sentido de uma indenização pelo não atendimento do CC/2002, seja de ordem moral (o dano moral na esfera civil, projeta-se dos riscos da não conformidade) ou de ordem material, como prejuízos ligados a lucros e participações em resultados, e os de ordem penal que podem, no caso de falência, estar voltados ao prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem, nos termos do art. 168 da Lei 11.101/2005. Em especial o inc. II, § 1°, onde está grafado, entre os crimes dos credores o fato de omitir na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanço verdadeiro. Como exemplo temos a figura do leasing, pois é possível que um juízo entenda que a inclusão deste item como de propriedade, ativo imobilizado tangível, de uma pessoa jurídica diversa de quem possua o domínio, venha a caracterizar alteração da escrituração pela inclusão de elementos inexatos como é o espírito da Lei 11.101/05 em seu art. 168 inc. I – elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos. Até porque este mesmo item está escriturado como de propriedade da instituição financeira nos termos da lei, portanto, não pode existir como imobilizado em dois balanços de forma simultânea, devendo um deles, por lógica, estar equivocado. No caso, a pena prevista é a reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. Lembrando o teor do § 3°: “Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas neste artigo, na medida de sua culpabilidade”.
Com igual importância deve ser observada também a responsabilidade dos contadores, para medir a sua culpabilidade, uma vez que estes, por força do parágrafo único do art 1.177 do CC/2002, os contadores no exercício de suas funções, são pessoalmente responsáveis, perante a sociedade empresária, pelos atos culposos, e, perante terceiros, solidariamente com a sociedade empresária, pelos atos dolosos, podendo, quiçá, serem responsabilizados e obrigados a indenizar. Lembramos que o contador não pode arguir ignorância em relação ao Código Civil, como meio de afastar a sua responsabilidade, isto é defeso, por força do Dec.-lei 4.657/1962 com a redação dada pela Lei 12.376 de 2010, art. 3°: Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.
Inclusive sobre o não atendimento das regras relativas à implantação dos IFRSs existe a hipótese prevista no pronunciamento técnico CPC 26, causando a edição do Pronunciamento técnico CPC 26 – R1 a respeito da apresentação das demonstrações contábeis. §§ 19 e 20.
“19- Em circunstâncias extremamente raras, nas quais a administração vier a concluir que a conformidade com um requisito de Pronunciamento Técnico, Interpretação ou Orientação do CPC conduziria a uma apresentação tão enganosa que entraria em conflito com o objetivo das demonstrações contábeis estabelecido na Estrutura Conceitual para Elaboração e Divulgação de Relatório Contábil- Financeiro, a entidade não aplicará esse requisito e seguirá o disposto no item 20, a não ser que esse procedimento seja terminantemente vedado do ponto de vista legal e regulatório.
20-Quando a entidade não aplicar um requisito de um Pronunciamento Técnico, Interpretação ou Orientação do CPC ou de acordo com o item 19, deve divulgar: (…) (c) o título do Pronunciamento Técnico, Interpretação ou Orientação do CPC que a entidade não aplicou, a natureza dessa exceção, incluindo o tratamento que o Pronunciamento Técnico, Interpretação ou Orientação do CPC exigiria, a razão pela qual esse tratamento seria tão enganoso e entraria em conflito com o objetivo das demonstrações contábeis, estabelecido na Estrutura Conceitual para Elaboração e Divulgação.”
Afirma Dworkin [1]: “Às vezes, a certeza do direito é mais importante do que aquilo que o direito é”. Observa-se que desta frase, é possível raciocinar no sentido de que o valor marginal da certeza e da previsibilidade em diferentes circunstâncias deve prevalecer, para se garantir a estabilidade de determinadas matérias, uma vez que a estabilidade é crucial para haver uma coerência. No caso em exame, a Resolução CFC criou um grande problema de instabilidade, devendo, esta, ser afastada aplicando-se o vigente Código Civil. O reconhecimento desta supremacia não implica ofensa às Resoluções do CFC e nem ao processo de adaptação de registros contábeis às IFRSs. Pois é direito deste respeitável Conselho Federal de Contabilidade emitir normas contábeis, mas também é sua obrigação respeitar o Código Civil enquanto estiver em vigor.
[1] DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 45.